Vida de São Geraldo Majela e Santa Edviges (16 de outubro)
- Sacra Traditio

- 16 de out.
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Atualizado: 17 de out.

Santa Edviges era filha do conde Bertoldo de Andechs. Nasceu em Andechs, na Baviera, por volta de 1174. Sua irmã Gertrudes foi mãe de Santa Isabel da Hungria. Seus pais a confiaram, ainda menina, às religiosas do mosteiro de Kintzingen, na Francônia. Aos doze anos de idade, Edviges casou-se com o duque Henrique da Silésia, que tinha apenas dezoito anos, e Deus os abençoou com sete filhos, mas apenas uma deles, Gertrudes, sobreviveu à mãe e tornou-se abadessa de Trebnitz. O marido de Edviges herdou o ducado após a morte de seu pai, em 1202. Imediatamente, a pedido de sua esposa, fundou o grande mosteiro de religiosas cistercienses de Trebnitz, a cinco quilômetros de Breslau.
Conta-se que todos os malfeitores da Silésia foram condenados a trabalhar na construção do mosteiro, que foi o primeiro convento de religiosas na região. O duque e sua esposa fundaram também muitos outros mosteiros, com o que propagaram não apenas a vida religiosa em seus territórios, mas também a cultura germânica. Entre os mosteiros fundados havia de cistercienses, cônegos de Santo Agostinho, dominicanos e franciscanos. Henrique fundou o hospital da Santa Cruz em Breslau, e Santa Edviges um hospital para leprosas em Neumarkt, onde costumava cuidar pessoalmente das enfermas. Após o nascimento de seu último filho, em 1209, Edviges persuadiu o marido a fazerem voto de continência perpétua, e, a partir de então, viveram separados por longos períodos. Conta-se que, nos trinta anos que lhe restavam de vida, Henrique não voltou a cortar a barba nem a usar ouro, prata ou púrpura, sendo chamado Henrique, o Barbado.

Os filhos de Henrique e Edviges causaram-lhes muito sofrimento. Em 1212, o duque dividiu suas posses entre Henrique e Conrado, seus filhos varões, mas nenhum ficou satisfeito. Apesar de todos os esforços de Santa Edviges para reconciliá-los, os dois irmãos e seus partidários travaram batalha, e Henrique derrotou Conrado. Essa dor ajudou Santa Edviges a compreender e lamentar a vaidade das coisas do mundo, desapegando-se cada vez mais dele. Desde 1209, fixou sua principal residência no mosteiro de Trebnitz, onde se recolhia frequentemente. Durante os retiros, dormia na sala comum com as religiosas e seguia rigorosamente a disciplina. Usava apenas uma túnica e um manto, tanto no inverno como no verão, e sob as vestes trazia uma camisa de cilício, com mangas de seda branca para que ninguém o percebesse. Costumava caminhar descalça sobre a neve até a igreja, ferindo os pés, mas levava um par de sapatos na mão para calçá-los caso encontrasse alguém. Um abade, certa vez, presenteou-a com sapatos novos e arrancou-lhe a promessa de usá-los. Algum tempo depois, vendo-a novamente descalça, perguntou-lhe pelos sapatos, e Edviges os tirou do manto, dizendo: “Sempre os trago comigo.”
Certo dia uma criada que a acompanhava começou a queixar-se do frio. Edviges disse-lhe então para pôr os pés sobre suas pegadas. A mulher começou a sentir um grande calor que lhe invadia todo o corpo. Normalmente passava o dia a pão e água, ou comia apenas alguns legumes cozidos; durante quarenta anos absteve-se de carne. Depois de sua morte, sua nora Ana depôs diante de autoridades eclesiásticas que, “de todas as vidas de santos penitentes que lera, jamais encontrou quem superasse sua sogra na penitência”.1
A Providência ornou a alma dessa dama tão generosa com inúmeros favores, entre eles o dom de profecia e de revelação das coisas ocultas, que lhe tornava presentes acontecimentos que se davam a muita distância. Previu guerras e calamidades que assolariam seu país, curou cegos e outros enfermos. Muitas vezes foi surpreendida em profundo êxtase, envolvida por uma luz tão forte que chegava a ofuscar os que presenciavam o fenômeno.

Santa Edviges sempre evitou que o mistério de sua íntima união com o Senhor se tornasse conhecido. Entretanto, tal era o fervor que a invadia que não conseguia reprimir os suspiros, “gritos de amor e cantos de alegria que escapavam de seu coração para saudar seu Divino Noivo”.2
Certa vez uma freira, desejosa de saber o que ela fazia na igreja quando ali permanecia sozinha por longas horas, escondeu-se no coro, do qual presenciou uma cena admirável: depois de oscular cada assento usado pelas freiras para o canto do Ofício, ajoelhou-se diante do altar da Santíssima Virgem, acima do qual havia um crucifixo, e ali permaneceu com os braços abertos em forma de cruz. Enquanto assim rezava, o braço de Cristo desprendeu-se do madeiro e lhe abençoou dizendo: “Tua oração foi ouvida, obterás a graça que Me pedes”.3 Assim ela conquistava o Coração de Deus com seu amor e orações.
Para provar a seu Celestial Esposo sua fidelidade e amor, ela teve de ser exposta a uma terrível provação. Os demônios lhe apareciam em formas horríveis e a espancavam, repetindo com voz furiosa: “Por que você é tão santa?” Nesses momentos ela via suas forças misteriosamente paralisadas, enquanto tudo ficava imerso em escuridão e abandono. As portas do abismo se abriam diante da duquesa e as tentações mais delicadas se apresentavam. Todas as paixões que havia reprimido durante anos lhe assaltavam o espírito: ira, ódio, inveja… Se ela não soubesse que uma mão invisível a sustentava, logo desesperaria. Edviges, contudo, suportava tudo pacientemente. Quando o tempo da prova cessou, aquela mesma mão divina a elevou, conduzindo-a de novo ao reino da luz.
Como se aproximasse o dia de sua morte, o Senhor lhe fez antegozar a felicidade do Paraíso em prêmio por sua fidelidade durante os assaltos dos infernos: muitos cidadãos da Jerusalém Celeste vieram lhe visitar. No dia da Natividade da Santíssima Virgem, Catarina, sua fiel servidora, testemunhou uma cena maravilhosa: viu entrar em seu quarto vários bem-aventurados. Cheia de alegria, ela os saudava: “Queridos Santos, sejam bem-vindos! Santa Maria Madalena, Santa Catarina, Santa Tecla, Santa Úrsula!”4
Em 1227, os duques Henrique da Silésia e Ladislau de Sandomierz reuniram-se para organizar a defesa contra o ataque de Svatopluk da Pomerânia. O inimigo, ao saber, atacou-os de surpresa, e Henrique, que estava no banho, mal escapou com vida. Santa Edviges correu ao encontro do marido ferido, mas este já partira com Conrado da Mazóvia para defender os territórios de Ladislau, morto pelos inimigos. Henrique venceu e estabeleceu-se em Cracóvia, mas foi novamente surpreendido e feito prisioneiro por Conrado de Plock. Fiel e prudente, Edviges interveio e conseguiu a paz entre ambos, promovendo o casamento das netas de Henrique com os filhos de Conrado, evitando assim novo derramamento de sangue, o que lhe trouxe grande alegria.

Em 1238, morreu o duque Henrique, sucedido por seu filho Henrique, o Bom. Quando a notícia chegou ao mosteiro, as religiosas choraram muito, mas Edviges permaneceu serena e as consolou: “Por que vos queixais da vontade de Deus? Nossas vidas estão em Suas mãos, e tudo o que Ele faz está bem feito, seja nossa morte ou a dos que amamos.” Tomou então o hábito de Trebnitz, sem votos solenes, para continuar administrando seus bens em favor dos pobres. Certo dia, encontrou uma camponesa que não sabia o Pai-Nosso e começou a ensiná-la. Como a mulher não conseguisse aprender, a santa a levou para dormir em seu quarto e, aproveitando cada momento, repetiu-lhe a oração até que a pobre a soubesse de cor e compreendesse seu sentido.
Em 1240, os tártaros invadiram a Ucrânia e a Polônia. O duque Henrique II os enfrentou perto de Wahlstadt, onde, segundo relatos, os invasores usaram gases venenosos — “um fumo espesso e nauseante saía como serpente de tubos de cobre e atordoava os soldados poloneses”. Henrique pereceu na batalha. Três dias antes de chegar a notícia, Santa Edviges teve a revelação de sua morte e disse à amiga Dermudis: “Perdi meu filho; escapou-me das mãos como um passarinho e nunca mais o verei.” Quando o mensageiro confirmou, ela consolou sua filha Gertrudes e a nora Ana.

Deus recompensou a fé de Sua serva com o dom dos milagres: uma religiosa cega recuperou a visão quando Edviges traçou sobre ela o sinal da cruz, e muitos outros prodígios e profecias foram atribuídos à santa, inclusive o anúncio de sua própria morte. Durante a última enfermidade, pediu a extrema-unção quando todos a julgavam fora de perigo. Morreu em outubro de 1243 e foi sepultada em Trebnitz. Sua canonização deu-se em 1267, e em 1706 sua Festa foi incluída no calendário geral da Igreja do Ocidente.
Existe em latim uma biografia ou “lenda” de Santa Edviges, escrita provavelmente no final do século XIII, baseada nas memórias do cisterciense Engelberto de Leubus. Há duas versões, uma curta e outra longa, ambas publicadas nos Acta Sanctorum (outubro, vol. VI). Em Schlakenwert conserva-se um manuscrito de 1353, notável pelas miniaturas iluminadas, reproduzidas em obras como Die hl. Hedwig (Riesch, 1926). Entre as biografias destacam-se as de Y. H. Görlich (1854), F. Becker (1872), F. Promnitz (1926) e K. e F. Metzger (1927). Em francês, destaca-se a de G. Bazin (1866). Ver também G. Morin em Revue Bénédictine (1890) e H. Quillus, Königin Hedwig von Polen (1938). Nos Estados Unidos publicou-se uma biografia popular com o título The Glowing Lily (E. Markowa, 1946).5
SÃO GERARDO (OU GERALDO) MAJELA (1755 d.C.)

Pio IX chamou São Gerardo de “modelo perfeito dos irmãos leigos”, e Leão XIII afirmou que ele foi “um dos jovens mais angélicos que Deus deu aos homens como exemplo”.
Em seus vinte e nove anos de vida, o santo tornou-se o mais famoso taumaturgo do século XVIII. Nasceu em Muro, a setenta quilômetros de Nápoles. Seu pai era alfaiate. Sua mãe, após a morte de Gerardo, deu este testemunho:
“Meu filho só era feliz quando se ajoelhava na igreja, diante do Santíssimo Sacramento. Frequentemente entrava para rezar e esquecia até a hora da refeição. Em casa rezava o tempo todo. Verdadeiramente, nascera para o Céu.”
O jovem predestinado
Desde muito jovem deu manifestações de ser uma alma predileta da Providência: nunca pedia alimento e, em alguns dias da semana, chegava a rejeitá-lo, prenunciando os jejuns que haveria de praticar mais tarde e sua célebre máxima:
“O amor a Deus não entra na alma se o estômago está cheio”.6

Seu principal passatempo consistia em erigir pequenos altares, adornando-os com velas e flores; mas seu local preferido era a capela de Capodigiano, dedicada à Santíssima Virgem, distante de Muro cerca de 2 km. Dali voltou, certa vez, trazendo um pequeno pão branco. Indagado pela mãe acerca de quem lhe havia dado o alimento, respondeu: “O filho de uma bela senhora com o qual brinquei”.7
Como o fato se repetisse diariamente durante vários meses, uma de suas irmãs o seguiu um dia, sem ele perceber, e pôde testemunhar o seguinte espetáculo: apenas Geraldo se ajoelhou aos pés da imagem de Maria, o Menino Jesus desceu dos braços de sua Mãe para brincar com ele e, ao despedir-Se, entregou-lhe um pãozinho.
Sua Primeira Comunhão não foi menos extraordinária: tendo recebido do pároco uma categórica resposta negativa, por ser ainda muito novo para receber o Pão dos fortes, o pequeno Geraldo pôs-se a soluçar no fundo da igreja. Na mesma noite apareceu-lhe São Miguel Arcanjo e lhe administrou a Sagrada Eucaristia!

Já na adolescência, sinal de contradição
Quando Gerardo tinha dez anos, seu confessor lhe deu permissão para comungar a cada três dias; como era uma época em que a influência do jansenismo ainda se fazia sentir, isso demonstra que o confessor via em Gerardo uma criança excepcionalmente dotada para a piedade. Com a morte do pai, Gerardo teve de abandonar a escola e começou a trabalhar como aprendiz de alfaiate na oficina de Martim Pannuto, um homem muito bom, que o compreendia e estimava. Mas o chefe dos empregados, pelo contrário, tomou-se de aversão pelo jovenzinho, justamente por vê-lo tão piedoso. Acusava-o de vagabundo, cobria-o de bofetadas, a ponto de, em uma ocasião, fazê-lo perder os sentidos. Geraldo jamais se queixava com o patrão; antes, alegrava-se em padecer por Jesus e repetia a seu carrasco: “Batei, batei mais, eu mereço este castigo!”.8 Ele se irritava ainda mais com a paciência com que Gerardo suportava suas grosserias.
Algum tempo depois, pôs-se a serviço de Dom Albini, Bispo de Lacedonia, conhecido por seu caráter irascível. Durante três anos Geraldo suportou humilhações, reprimendas, maus-tratos… Numa ocasião, deixou cair na cisterna o molho de chaves da residência episcopal. Em meio a uma terrível aflição, só encontrou uma saída: fez descer até o fundo do poço, amarrada na corda, uma imagem do Menino Jesus, enquanto suplicava: “Só Vós podeis ajudar-me… Se não vierdes em meu socorro, Monsenhor ralhará comigo. Por favor, devolvei-me a chave!”.9 Puxou a corda e — oh, maravilha! — a imagem trazia as chaves na mão. Este prodígio e sua heroica paciência valeram-lhe a admiração de toda a cidade, exceção feita do próprio prelado. E quando este faleceu, Gerardo demonstrou com suas lágrimas quanto estimava aquele que tanto o fazia sofrer: — Perdi meu melhor amigo! — exclamava desconsolado.
Tendo retornado a Muro, Geraldo abriu uma alfaiataria. Enquanto a agulha corria entre seus dedos ágeis, sua alma elevava-se às alturas da contemplação. Nutria filial devoção por Maria Santíssima, a quem consagrara sua virgindade, e bastava-lhe pronunciar seu nome para experimentar transportes de amor.

Inebriado pela “loucura” da Cruz (cf. I Cor 1, 18), em tudo buscava imitar os sofrimentos do Salvador: flagelava-se até o sangue, fazia-se de louco para atrair o desprezo de seus concidadãos, passava dias inteiros sem comer e, às noites, escalava a torre da catedral para introduzir-se pelas arcadas dos sinos e ir rezar aos pés do Santíssimo Sacramento.
“Mais louco sois Vós, Senhor!”
Se, de um lado, o demônio lhe armava ciladas, aparecendo como um cão furioso ou provocando acidentes, de outro, o Senhor o recompensava com inúmeras consolações. Numa dessas longas vigílias, uma voz suave, vinda do sacrário, rasgou o silêncio noturno: “Pazzerello! — Louquinho!”.10 A resposta brotou rápida em seus lábios ardorosos: “Mais louco sois Vós, Senhor, que por amor estais aqui, prisioneiro no tabernáculo!”.11
Quando aprendeu perfeitamente o ofício, Gerardo pediu para ser admitido no convento dos capuchinhos de Muro, onde seu tio era frade; mas foi recusado por causa da juventude e da fragilidade. Então começou a trabalhar como criado na casa do bispo de Lacedogna. Humanamente, foi uma má escolha, pois o prelado era um homem de caráter irascível que o tratava com grande aspereza. Apesar disso, Gerardo o serviu fielmente e sem uma queixa até a morte do bispo, em 1745. Depois, voltou a Muro e abriu uma alfaiataria por conta própria. Vivia com sua mãe e três irmãs. Costumava dar à mãe um terço do que ganhava; outro terço distribuía entre os pobres e o restante usava para pagar missas pelas almas do purgatório. Passava muitas horas da noite em oração na catedral e praticava severas penitências.

Ingressando na Congregação do Santíssimo Redentor
Ser religioso sempre fora o sonho de Geraldo; contudo, aprouve à Providência provar-lhe a perseverança antes de aceitar sua entrega. Fracassou em duas tentativas de ingresso nos capuchinhos e numa curta experiência como anacoreta. Isto desanimaria qualquer outro, não o jovem Majela!
Quando tinha vinte e três anos, os padres da Congregação do Santíssimo Redentor, recentemente fundada, pregaram uma missão em Muro. O jovem pediu que o admitissem como irmão leigo, mas seu aspecto doentio não o ajudava, e sua mãe e irmãs não queriam vê-lo partir. Contudo, Gerardo insistiu, e finalmente o Pe. Cafaro o enviou à casa de Deliceto, onde era superior, com um bilhete que dizia: “Envio-vos este irmãozinho inútil.” Como teimasse em sua resolução e o importunasse sem cessar, o padre Cafaro pediu que sua mãe o trancasse no quarto, no dia da partida dos missionários. O jovem, porém, usando uma corda fabricada com lençóis, escapou pela janela e correu atrás dos redentoristas, deixando um bilhete para a família:
“Vou tornar-me santo. Esquecei-me”.12
Posteriormente, quando o padre voltou, percebeu o erro e concedeu-lhe o hábito. Os irmãos, vendo Gerardo trabalhar com ardor, pontualidade e humildade na sacristia e no jardim, diziam: “Ou é um louco ou é um santo.” O fundador da congregação, Santo Afonso Maria de Ligório, reconheceu a santidade do jovem e abreviou seu noviciado. O irmão Gerardo professou em 1752, acrescentando aos votos habituais o de fazer sempre o que fosse, a seu juízo, mais agradável a Deus.
Nos três anos seguintes, trabalhou como alfaiate e enfermeiro da comunidade; também pedia esmolas de porta em porta, e os padres gostavam de levá-lo às missões, pois possuía o dom de ler nas almas. Converteu inúmeros pecadores ao revelar-lhes seus pecados ocultos. Sua vida foi repleta de fenômenos sobrenaturais: foi visto suspenso no ar, bilocava-se, tinha dons de profecia, ciência infusa e domínio sobre os animais. Só a voz da obediência o arrancava dos êxtases.
Em Nápoles, testemunhou milagrosamente o assassinato do arcipreste de Muro a setenta quilômetros de distância. Em outra ocasião, leu o pensamento do secretário do arcebispo de Conza, que, tocado, mudou de vida e reconciliou-se com a esposa. O episódio mais célebre foi sua bilocação: assistiu um enfermo em Caposele e, ao mesmo tempo, conversava com um amigo no mosteiro. Quando o superior o procurou na cela e não o encontrou, achou-o rezando na capela; interrogado, Gerardo revelou que pedira a Deus para torná-lo invisível e poder orar em paz. O superior respondeu: “Bem, por esta vez te perdôo, mas não peças isso novamente a Deus.”

Entretanto, São Gerardo não foi canonizado por causa de seus milagres, pois estes eram apenas um efeito de sua santidade, e Deus poderia muito bem ter disposto que o santo não realizasse milagre algum, sem que isso diminuísse em nada a bondade, a caridade e a devoção que o jovem Pio IX e Leão XIII louvaram. Um dos resultados mais surpreendentes de sua fama de santidade foi o fato de seus superiores permitirem que ele dirigisse várias comunidades de religiosas — algo incomum para um irmão leigo. São Gerardo falava pessoalmente com cada religiosa e costumava dar conferências através da grade do parlatório. Além disso, aconselhava por carta diversos sacerdotes, religiosos e superiores. Ainda se conservam algumas de suas cartas. Nelas não há nada de extraordinário: em algumas expõe simplesmente o dever de todo cristão de servir a Deus conforme sua vocação; em outras, incita à bondade uma superiora, exorta à vigilância uma noviça, consola um pároco e prega a todos a conformidade com a vontade divina.

Em 1753, os estudantes de teologia de Deliceto fizeram uma peregrinação ao santuário de São Miguel, no Monte Gárgano. Embora tivessem apenas algumas moedas para cobrir as despesas da viagem, sentiam-se seguros, porque o irmão Gerardo ia com eles. E, de fato, o santo se arranjou de modo que nada lhes faltasse nos nove dias da peregrinação, que se transformou em uma verdadeira sequência de milagres. Exatamente um ano depois, São Gerardo sofreu uma das provas mais terríveis de sua vida. Uma jovem de vida dissoluta, chamada Neria Caggiano, a quem o santo havia ajudado, o acusou falsamente de tê-la seduzido. Santo Afonso mandou chamá-lo imediatamente a Nocera. Pensando que seu voto de perfeição o obrigava a não se defender, Gerardo permaneceu em silêncio — o que apenas colocou seu superior em apuros, pois este não podia acreditar em sua culpa. Santo Afonso proibiu-lhe, por algumas semanas, de comungar e de falar com estranhos. Gerardo respondeu calmamente: “Deus, que está no Céu, não deixará de me defender.” Poucas semanas depois, Neria e sua cúmplice confessaram que haviam caluniado o irmão. Santo Afonso perguntou então por que ele não se defendera, e Gerardo respondeu: “Padre, acaso não temos uma regra que nos proíbe desculpar-nos?” 13 (Naturalmente, a regra não fora feita para casos assim).
Pouco tempo depois, o santo acompanhou o Pe. Margotta a Nápoles, onde o povo cercou, dia e noite, a casa dos redentoristas para ver o famoso taumaturgo. Finalmente, após quatro meses, os superiores foram obrigados a enviá-lo à casa de Caposele, onde foi nomeado porteiro.
Esse ofício agradava especialmente ao jovem. O Pe. Tannoia escreveu: “Naquele tempo, nossa casa era constantemente procurada por mendigos. O irmão Gerardo cuidava deles como uma mãe. Tinha o dom de contentar a todos, e a tolice e malícia de alguns pedintes jamais lhe faziam perder a paciência.” Durante o rigoroso inverno daquele ano, duzentas pessoas — entre homens, mulheres e crianças — acudiam diariamente à casa dos redentoristas, e o santo porteiro lhes fornecia comida, roupas e combustível, sem que ninguém soubesse de onde provinham. Na primavera seguinte, foi novamente a Nápoles. Ao passar por Calitri, terra natal do Pe. Margotta, o povo lhe atribuiu vários milagres. Quando voltou a Caposele, os superiores o encarregaram da supervisão das construções em andamento. Certa sexta-feira, quando não havia na casa um só centavo para pagar os trabalhadores, as orações do santo moveram um benfeitor inesperado a doar o suficiente para resolver o problema. São Gerardo passou o verão pedindo esmolas para as obras.

A morte do Santo O calor do sul da Itália arruinou sua saúde, e nos meses de julho e agosto o santo enfraqueceu rapidamente. Teve de passar uma semana acamado em Orvieto, onde curou um outro irmão leigo que fora assisti-lo e adoecera. Chegou a Caposele quase arrastando-se. Em setembro, conseguiu deixar o leito por alguns dias, mas logo recaiu. Suas últimas semanas foram uma mistura de sofrimentos físicos e êxtases, quando seus dons de profecia e ciência infusa atingiram um grau extraordinário. Morreu na data e hora que havia predito, pouco antes da meia-noite de 15 de outubro de 1755. Foi canonizado em 1904.
A principal fonte de informações sobre São Gerardo é a biografia do Pe. Tannoia, traduzida para o inglês na Oratorian Series e publicada no volume Lives of the Companions of St. Alphonsus (1849), pp. 243-453. Entre as biografias em inglês destacam-se as de O. Vassall-Philips, Life of St. Gerard Majella (1914); Saint-Omer, Life, Virtues and Miracles of St. Gerard Majella (1907); e J. Carr, To Heaven through a Window (1946). A melhor biografia alemã é a do Pe. Dilgskron (1923). 14
Referências:
1. Montanhese, op. cit., p.71.
2. Knoblich, op. cit., p.230.
3. Idem, p.231.
4. Idem, p.280.
5. Butler, Alban. Vida dos Santos, vol. 4, pp. 126-128.
6. São Tomás de Aquino. Suma Teológica. I-II, q.69, a.2, ad 3.
7. Saint-Omer, CSsR, Édouard. Le Thaumaturge du XVIIIe siècle ou la vie, les vertus et les miracles du Bienheureux Gérard-Marie Majela. Desclée de Brouwer et Cie, 1893, p.2.
8. Dunoyer, op. cit., p.21.
9. Idem, p.32.
10. Rey-Mermet, op. cit., p.32.
11. Idem, ibidem.
13. Rey-Mermet,, op. cit., p.115.
14. Butler, Alban. Vida dos Santos, vol. 4, pp. 134-137. Também tirado, traduzido e adaptado livro "A vida dos Santos" de Butler e dos artigos "São Geraldo Majela – Uma alma pura que viu a Deus" e "Santa Edwiges – Destinada ao combate e à vitória".


























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