Vida de São Marcial de Limoges e São Teobaldo de Provins (30 de junho)
- Sacra Traditio
- 30 de jun.
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Atualizado: 13 de ago.
A COMEMORAÇÃO DE SÃO PAULO
Como a Missa e o Ofício do dia 29 de junho estão consagrados de maneira principal a São Pedro, no dia seguinte faz-se uma comemoração especial de São Paulo. De toda forma, o dia 29 de junho é a festa de São Paulo, assim como a de São Pedro e, por isso, a nota sobre São Paulo aparece em sua data.
SÃO MARCIAL, BISPO DE LIMOGES (c. 250 d.C.)

O que realmente se sabe sobre São Marcial é que foi bispo de Limoges e objeto de veneração desde tempos muito remotos, como apóstolo da região de Limousin e fundador da sé episcopal que ocupou. É muito provável que tenha vivido por volta do ano 250. Segundo a tradição que remonta ao século VI e foi registrada por São Gregório de Tours, era um dos sete missionários enviados de Roma para as Gálias pouco antes do ano 250: São Gaitano foi para Tours, São Trófimo para Arles, São Paulo para Narbona, São Marcial para Limoges, São Dionísio (Denis) para Paris, São Saturnino para Toulouse e São Austremônio para a Auvérnia. Cada um evangelizou o distrito que havia escolhido e foi o primeiro bispo da respectiva sé. Nas mais antigas ladainhas de Limoges, São Marcial aparece como um confessor, mas, com o tempo, os monges da abadia local de São Marcial (que conserva as relíquias do santo) iniciaram uma campanha para que fosse honrado como apóstolo. Já então, sua lenda havia se desenvolvido bastante, e ele era tido não apenas como apóstolo da Aquitânia, mas como alguém que conheceu pessoalmente Jesus Cristo — talvez o menino que carregava o cesto de pães na multiplicação, ou um dos setenta e dois discípulos. A questão de seu título foi considerada tão importante que chegou a ser discutida em diversos sínodos. No século XI, o culto a São Marcial foi impulsionado pela reconstrução da abadia dedicada ao seu nome, pela translação de seus restos mortais para um santuário erguido na própria abadia e pela propagação de narrativas fantásticas que reuniam diversas lendas, ampliando-as e apresentando-as como as “atas” autênticas do santo bispo, redigidas por seu sucessor na sé de Limoges, São Aureliano.
Que essa fábula extravagante, repleta de anacronismos e inverossimilhanças, fosse tida como certa naquela época de credulidade absoluta, não causa surpresa; o que espanta é que, ainda hoje, em alguns lugares, seja tida como verdadeira.

Diz-se que Marcial foi convertido ao cristianismo aos quinze anos pelas pregações de Nosso Senhor; que foi batizado por seu parente São Pedro; que esteve presente na ressurreição de Lázaro; que serviu a Jesus na Última Ceia e que recebeu o Espírito Santo com os demais discípulos no Pentecostes. São Pedro, a quem acompanhou primeiro a Antioquia e depois a Roma, enviou-o a pregar o Evangelho nas Gálias. Em nome de São Pedro, ressuscitou seu companheiro São Austricliniano, que havia morrido na viagem. Ao chegar a Tulle, curou a filha da família que o hospedara, expulsando o espírito maligno que a possuía, e ressuscitou o filho do governador romano, estrangulado por um demônio. Esses milagres levaram à conversão de 3.600 pessoas. Os sacerdotes pagãos que ousavam atacá-lo eram imediatamente punidos com cegueira, até que as orações do santo lhes devolviam a visão. Outros, que o golpearam e o prenderam na prisão de Limoges, foram fulminados por um raio, mas Marcial lhes devolveu a vida a pedido dos cidadãos. Um dos sacerdotes ressuscitados foi Aureliano, o suposto autor dessas “atas”. Batismos em massa seguiram-se a esses prodígios. Entre os penitentes de São Marcial havia uma nobre dama chamada Valéria. Ela declarou sua decisão de consagrar sua virgindade a Nosso Senhor e foi decapitada pelos sicários enviados pelo duque Estêvão, seu prometido. Após o martírio, a jovem recolheu sua cabeça e a levou até a igreja onde estava São Marcial. O próprio duque Estêvão converteu-se e fez peregrinação a Roma, onde encontrou São Pedro instruindo o povo num local chamado Vaticano. O duque informou São Pedro sobre as atividades de São Marcial e o progresso das missões nas Gálias. No ano quarenta após a Ressurreição — o ano setenta e quatro da nossa era —, São Marcial teve uma visão que lhe anunciou a morte e, quinze dias depois, entregou sua alma a Deus, cercado por seus fiéis.
Afirma-se que o Papa João XIX autorizou que se atribuísse a São Marcial o título de “apóstolo”, mas, em 1854, a Congregação dos Ritos recusou-se a ratificar tal designação e decidiu que, na Missa, nas ladainhas e nos ofícios, São Marcial fosse venerado como bispo e confessor. No entanto, nesse mesmo ano, o bispo de Limoges reiterou o pedido ao Papa Pio IX e obteve resposta favorável, para que, na diocese, São Marcial fosse honrado com os usos e precedências de um apóstolo.

Existem três relatos antigos sobre a vida de São Marcial. O primeiro, com uma breve biografia e uma longa lista de seus milagres, encontra-se no De Gloria Confessorum (cap. XXVI; cf. Hist. Francorum, I, 28) de São Gregório de Tours. Aí se estabelece a chegada de São Marcial por volta do ano 250. O segundo é mais extenso e possivelmente data do século IX. Nele se afirma que o santo foi enviado a Limoges por São Pedro, mas seus trabalhos missionários, imediatamente frutíferos e acompanhados de grandes prodígios, limitam-se à diocese de Limoges. O melhor texto dessa biografia foi editado por C. F. Bellet em seu livro L’ancienne vie de St. Martial et la prose rythmée (1897). A terceira biografia, a mais fantástica, afirma ter sido escrita por São Aureliano, sucessor de Marcial, mas tem muito em comum com a Historia Apostolica, documento apócrifo impresso sob o nome de Abdias. Nela, São Marcial aparece pregando em todo o sul da França com o apoio do duque Estêvão. Há razões para crer que tal história tenha sido forjada por Adhemar de Chabannes com o objetivo de engrandecer a glória da abadia de São Marcial, onde fora educado. Parece que foi Adhemar quem falsificou a bula do Papa João XIX para autorizar o culto de São Marcial como um dos verdadeiros apóstolos; também é suspeito de ter falsificado outros documentos semelhantes. O assunto foi devidamente investigado por Louis Saltet no Bulletin de Littérature ecclésiastique (Toulouse, 1925), pp. 181–186 e 279–302; 1926: pp. 117–139 e 145–160; 1931, pp. 149–165. Ver também Duchesne em Annales du Midi, vol. IY (1892), pp. 289–339; e seu Fastes Episcopaux, vol. I, pp. 104–117; e finalmente, um extenso artigo de Leclercq na Dictionnaire d’Archéologie Chrétienne, vol. IX, col. 1063–1167, complementado com ampla bibliografia. As afirmações feitas nesse artigo, como indica Saltet (loc. cit. 1931, pp. 163–165), são passíveis de crítica. Ao santo é atribuído o título de “apóstolo” em uma ladainha de Winchester datada do século XI (Arundel MS. 60). Ver Analecta Bollandiana, vol. LXIV (1946), pp. 84–86; e cf. H. M. Colvin, The White Canons in England (1951), pp. 51–52. [1]
SÃO TEOBALDO OU THIBAUD DE PROVINS (1066 d.C.)

Este Teobaldo era da família dos condes de Champagne, filho do conde Arnoul, nascido em Provins, na região de Brie, em 1017. Em sua juventude, leu obras sobre a vida dos padres do deserto e ficou profundamente impressionado pelos exemplos de abnegação, renúncia, contemplação e perfeição cristã que ali se apresentavam; a existência de São João Batista, São Paulo, o Eremita, Santo Antão e São Arsênio nas solidões ermas o fascinava, e ele não desejava outra coisa senão imitá-los. Quando seu pai lhe ordenou que assumisse o comando de um corpo de tropas para empreender uma campanha, o jovem lhe reiterou, com muito respeito, que estaria disposto a obedecer, não fosse o fato de ter feito voto de afastar-se do mundo. A contragosto, o conde Arnoul acabou por dar seu consentimento.
Junto com outro jovem da nobreza, chamado Walter, refugiou-se na abadia de Saint Remi, em Reims. Ambos, vestidos como mendigos, saíram pouco depois do mosteiro; dirigiram-se, primeiro, a Suxy, nas Ardenas, e depois aos bosques de Pettingen, em Luxemburgo, onde encontraram a absoluta solidão que buscavam. Ali construíram duas pequenas celas para nelas viverem. Como o trabalho manual é um dever necessário na vida de ascetismo — ou penitência — e eles não sabiam tecer esteiras nem cestos, iam diariamente à povoação mais próxima para oferecer-se, por jornada, como peões dos pedreiros, ajudantes dos lavradores, ou para carregar pedras, recolher colheitas, carregar e descarregar carroças, limpar os estábulos ou mover os foles das forjas dos ferreiros. Gastavam seus salários na compra de um pouco de pão de centeio, que era tudo o que comiam, e davam o restante aos pobres. Enquanto trabalhavam com as mãos, mantinham o coração posto na oração; durante a noite, velavam para cantar juntos os salmos. A fama de sua santidade os incomodava a tal ponto que decidiram partir daquele lugar, onde já não podiam viver ignorados. Empreenderam uma peregrinação a Santiago de Compostela e de lá foram a Roma. Depois de visitar todos os lugares de veneração na Itália, escolheram, para se retirarem, um bosquezinho chamado Salanigo, perto de Vicenza. Dois anos depois, Deus chamou para Si Walier. Teobaldo tomou a perda do amigo como um aviso de que ele próprio tinha pouco tempo de vida e, então, multiplicou suas penitências, austeridades e orações. Numerosos discípulos reuniam-se ao seu redor, e o bispo de Vicenza elevou-o às ordens sacerdotais, para que pudesse assisti-los com maior proveito.
Sua fama se espalhou tanto que não tardaram a descobrir-se seus antecedentes, sua dignidade e seu sangue nobre; os pais de Teobaldo receberam a notícia de que o filho, que julgavam morto, estava vivo, e que não era outro senão aquele eremita de Salanigo, de quem tantas histórias de santidade, milagres e profecias haviam ouvido. Tanto o conde quanto sua esposa já eram muito idosos, mas imediatamente empreenderam viagem à Itália para ver o filho. Gisele, a condessa, obteve permissão do marido para permanecer junto ao eremita até o fim de seus dias, e Teobaldo construiu para ela uma choupana a curta distância da sua. Pouco tempo depois, São Teobaldo caiu enfermo, mas não para morrer: sobreveio-lhe uma enfermidade dolorosa e repugnante, que ele suportou com infinita paciência. Pouco antes de morrer, mandou chamar um abade dos eremitas camaldulenses, de cujas mãos havia recebido o hábito. A ele fez sua profissão, confiou-lhe sua mãe e seus discípulos e, após receber o viático, morreu em paz, no último dia de junho de 1066. Menos de sete anos depois, foi canonizado pelo Papa Alexandre II.
Uma biografia contemporânea muito completa, escrita por Pedro, abade de Vangadizza, foi impressa por Mabillon e pelos bolandistas nos Acta Sanctorum, junho, vol. VII. Por uma confusão bastante curiosa, Teobaldo foi honrado, erroneamente, como fundador da igreja e da cidade de Thann, na Alsácia. Ver Analecta Bollandiana, vol. XXIV (1905), p. 150; R. Thompson, em The Old French Poems on St. Thibaut (1936). O santo é padroeiro dos carvoeiros e, por vezes, é chamado de “le Charbonnier”. [2]
Referência:
Butler, Alban. Vida dos Santos, vol. 2, pp. 685–687.
Ibid. pp. 687-688.
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