top of page

Vida de São Bruno e Santa Maria Francisca de Nápoles, virgem (6 de outubro)



São Bruno, retratado por Vincenzo Carducci.
São Bruno, retratado por Vincenzo Carducci.

O sábio e devoto cardeal Bona, falando dos monges cartuxos, cuja ordem foi fundada por São Bruno, os chama de o grande milagre do mundo: vivem no mundo como se estivessem fora dele; são anjos na terra, como João Batista no deserto, e constituem o maior ornamento da Igreja; elevam-se ao céu como águias, e o seu instituto religioso está acima de todos os outros.” O fundador dessa ordem extraordinária nascera no seio de uma família distinta, por volta do ano 1030, em Colônia. Partiu de sua cidade natal quando ainda era jovem, para prosseguir os estudos na escola catedralícia de Reims. Quando voltou a Colônia, recebeu a ordenação sacerdotal e foi-lhe conferido um Cânon na colegiata de São Cuniberto (ainda que seja possível que já gozasse desse título antes de partir para Reims). No ano de 1056, foi convidado a ensinar gramática e teologia em sua antiga escola. O fato de ter sido escolhido para cargos tão importantes quando contava apenas vinte e sete anos demonstra que era um homem extraordinário, mas não revela os caminhos que Deus lhe havia reservado para torná-lo uma luz da Igreja. Bruno dedicava-se a ensinar “aos clérigos mais avançados e versados nas ciências, não aos principiantes”. Seu principal empenho consistia em conduzir seus discípulos a Deus e em ensinar-lhes a respeitar e amar a lei divina. Muitos deles se tornaram eminentes filósofos e teólogos, honraram o mestre com seus talentos e habilidades e espalharam sua fama até os recantos mais distantes. Um deles, Eudes de Châtillon, subiu ao trono pontifício com o nome de Urbano II e foi beatificado.

Um acontecimento horrível se deu em Paris antes de ele deixar a cidade. Morreu um professor da Universidade de Sorbonne, que sempre fora considerado muito erudito e, ao mesmo tempo, muito devoto. Sua morte parecia feliz, pois ocorreu logo após ter recebido os santos sacramentos. Porém, quando o cadáver foi conduzido à igreja, para as cerimônias fúnebres e orações habituais, eis que o morto se levantou durante o Ofício de Defuntos, para grande horror dos presentes, e gritou com uma voz terrível:

“A justiça de Deus me acusou!”

No segundo dia, quando os clérigos chegaram à mesma leitura do Ofício, o corpo se moveu novamente e vociferou com tons medonhos:


“A justiça de Deus me rejeitou!”

No terceiro dia, aconteceu o mesmo: o morto, sentado, clamou com uma voz ainda mais assustadora:


A justiça de Deus me condenou!

Pode-se facilmente imaginar os sentimentos de todos os presentes: não houve ninguém que não ficasse pálido e não deixasse a igreja com temor e com tremor.


“A conversão de São Bruno ante o corpo de Diocrés”, por Vincenzo Carducci.
“A conversão de São Bruno ante o corpo de Diocrés”, por Vincenzo Carducci.

Juntamente com seis de seus amigos, Bruno presenciou esse triste acontecimento e teve seu coração profundamente tocado pela graça divina. Ficou tão mexido com o terrível julgamento do Todo-Poderoso, que resolveu, a partir daquele momento, retirar-se do mundo e trabalhar com mais perseverança na salvação de sua alma para que, um dia, pudesse justificar-se ante o trono divino. Informou os companheiros de sua decisão e persuadiu-os, pela seriedade de suas palavras, a adotar a mesma resolução. Eles não demoraram a realizar este intento: venderam imediatamente tudo o que possuíam, deram-no aos pobres e, despedindo-se de seus conhecidos, foram de Paris a Grenoble (sudeste da França), vestidos com as modestas roupas de peregrinos.


Eles contaram a São Hugo, o respeitável bispo daquela cidade, tudo o que havia acontecido, informaram-no de seus planos e suplicaram que lhes destinasse um lugar em sua diocese, onde pudessem viver em solidão e, por meio de uma vida piedosa, merecer graças perante o divino Juiz. Hugo sonhara, na noite anterior, com sete estrelas brilhantes caindo a seus pés; e quando viu esses sete homens, tão humildes e cheios de santo zelo, não duvidou: satisfeito com a resolução que tomaram, Deus prenunciara a vinda deles por meio desse sonho. [1]

São Bruno investido com o hábito da ordem
São Bruno investido com o hábito da ordem.

São Bruno foi professor na escola de Reims, onde manteve, durante dezoito anos, um alto nível nos estudos. Depois, foi nomeado chanceler da diocese pelo arcebispo Manassés, que era um personagem absolutamente indigno de seu alto cargo. Bruno teve logo ocasião de conhecer a má vida de seu protetor. O legado papal, Hugo de Saint-Dié, citou Manassés a juízo diante do Concílio de Autun, em 1076; mas o arcebispo recusou-se a comparecer e foi suspenso no exercício de suas funções. São Bruno, o preboste da diocese (também chamado Manassés) e um cônego de Reims, chamado Pôncio, acusaram o arcebispo diante do Concílio. A atitude de São Bruno foi tão prudente e reservada que impressionou o legado, o qual, escrevendo ao Papa, elogiou a virtude e a prudência de nosso santo. O arcebispo de Reims, furioso contra os três cônegos que o haviam acusado, mandou saquear e destruir suas casas e vendeu seus benefícios eclesiásticos. Os três cônegos refugiaram-se no castelo de Ebles de Roucy; ali permaneceram até que o arcebispo simoníaco, enganando São Gregório VII (o que não era fácil), conseguiu ser restituído ao governo de sua diocese. São Bruno então se transferiu para Colônia.


Por aquele tempo, já havia decidido abandonar todo cargo eclesiástico, — conforme havia comunicado em carta a Raúl, preboste de Reims. Durante uma conversa que tiveram São Bruno, Raúl e outro cônego no jardim do castelo de Ebles de Roucy, discutiram sobre a vaidade e falsidade das ambições mundanas e sobre as alegrias da vida eterna. Os três ficaram profundamente impressionados com aquela conversa e prometeram abandonar o mundo. Contudo, adiaram a execução de seus planos até que o cônego voltasse de Roma, para onde devia viajar. Mas este não retornou, Raúl vacilou em sua resolução e voltou a estabelecer-se em Reims. Bruno foi o único que perseverou em seu propósito de abraçar a vida religiosa, apesar de tudo lhe sorrir, pois possuía grandes riquezas e gozava de grande favor entre os homens importantes. Se tivesse permanecido no mundo, teria sido em breve eleito arcebispo de Reims. Em vez disso, renunciou a seu benefício eclesiástico e a todas as suas riquezas, e convenceu alguns amigos a retirarem-se com ele para a solidão. No início, colocaram-se sob a direção de São Roberto, abade de Molesmes (que mais tarde colaborou na fundação de Cister), e estabeleceram-se em Séche-Fontaine, perto de Molesmes. Durante sua estada ali, Bruno, desejoso de maior virtude e perfeição, começou a refletir e consultar seus companheiros sobre o que deveriam fazer para alcançá-las. Depois de muita penitência e oração para conhecer a vontade de Deus, Bruno compreendeu que aquele lugar não se prestava aos seus propósitos e recorreu a São Hugo, bispo de Grenoble, que era um homem de Deus e podia ajudá-lo a discernir a vontade divina. Além disso, Bruno sabia que nos arredores de Grenoble havia muitos bosques solitários onde poderia encontrar a paz que desejava. Seis de seus primeiros companheiros partiram com ele para Grenoble; entre eles estava Landuino, que o sucederia no governo da Grande Cartuxa.


    A chegada de São Bruno a Grenoble em casa de São Hugo.
A chegada de São Bruno a Grenoble em casa de São Hugo.

Chegaram a Grenoble por volta de meados de 1084. Imediatamente se entrevistaram com São Hugo para pedir-lhe que lhes designasse um lugar onde pudessem dedicar-se ao serviço de Deus, longe do mundo e sustentando-se pelo trabalho de suas mãos. Hugo os recebeu de braços abertos, pois, segundo se conta, já havia visto em sonhos os sete forasteiros, enquanto o próprio Deus construía uma igreja no bosque da Cartuxa, e sete estrelas brilhavam no céu para lhe indicar o caminho. O bispo de Grenoble abraçou fraternalmente os peregrinos e designou-lhes o deserto da Cartuxa para que vivessem, prometendo-lhes toda a ajuda necessária para se estabelecerem. Mas, a fim de mantê-los atentos às dificuldades e para que soubessem perfeitamente o que os aguardava, preveniu-os de que o lugar era de difícil acesso por causa das montanhas abruptas e da neve que o cobria a maior parte do ano. São Bruno aceitou a oferta com grande alegria, e São Hugo concedeu-lhes todos os direitos que possuía sobre aquele bosque e os colocou em contato com o abade de Chaise-Dieu, na Auvérnia. Bruno e seus companheiros começaram construindo um oratório e uma série de celas a certa distância umas das outras, exatamente como nas antigas “lauras” da Palestina. Tal foi a origem da Ordem dos Cartuxos, que tomou o nome do deserto da Cartuxa.


São Hugo proibiu as mulheres de terem acesso ao local onde se haviam estabelecido Bruno e seus companheiros, assim como a caça, a pesca e a criação de gado na região. No início, os monges viviam aos pares nas celas, mas pouco depois cada um passou a ter a sua própria, reunindo-se apenas na igreja para o canto das matinas e das vésperas; o restante do ofício rezavam em particular. Somente nas grandes Festas comiam duas vezes por dia; nessas ocasiões reuniam-se no refeitório, mas, em geral, cada um comia em sua cela, como os eremitas. Em tudo reinava a maior pobreza; por exemplo, o único objeto de prata existente na igreja era o cálice. O tempo dividia-se entre o trabalho e a oração. Uma das principais ocupações dos monges consistia em copiar livros, com o que obtinham seu sustento. A única dependência verdadeiramente rica do mosteiro era a biblioteca. A terra era pouco fértil e o clima muito rigoroso, de modo que pouco se prestava para o cultivo; em compensação, a criação de gado prosperava.


O beato Pedro, o Venerável, abade de Cluny, escrevia cerca de vinte e cinco anos após a morte de São Bruno:


Seu vestuário era mais pobre que o dos demais monges e tão curto e delgado que causava espanto vê-los. Usavam camisas de pêlo sobre o corpo e jejuavam quase constantemente. Só comiam pão negro; jamais provavam carne, nem mesmo quando enfermos; nunca pescavam, mas comiam peixe quando alguém lho dava de esmola... Passavam o tempo em oração, leitura e trabalho; sua principal ocupação era copiar livros. Só celebravam Missa aos domingos e dias de Festa”.

São Bruno em oração
São Bruno em oração.

Tal era a vida que levavam, embora não tivessem regras escritas, mas inspiravam-se na Regra de São Bento nos pontos em que esta era compatível com a vida eremítica. São Bruno habituou seus discípulos a observar fielmente o modo de vida que lhes havia prescrito. Em 1127, o quinto prior da Cartuxa, chamado Guigues, pôs por escrito os usos e costumes. Guigues fez muitas modificações, e suas “Consuetudines” continuam até hoje sendo o livro essencial. Os cartuxos constituem a única das ordens antigas que nunca foi reformada e que não teve necessidade de reforma, graças ao seu absoluto isolamento do mundo e ao zelo que sempre demonstraram os superiores e visitadores em não abrir a porta às mitigações e dispensas. A Igreja considera a vida dos cartuxos como o modelo perfeito do estado de contemplação e penitência. No entanto, quando São Bruno se estabeleceu na Cartuxa, não tinha a menor intenção de fundar uma ordem religiosa. Se seus monges se espalharam, seis anos mais tarde, pelo Delfinado, isso se deveu, após a vontade de Deus, a um convite que lhes foi feito, e o mínimo que se pode dizer é que São Bruno não tinha o menor desejo de aceitar tal convite inesperado.


São Hugo concebeu tamanha admiração por São Bruno, que o tomou por diretor espiritual. Apesar das dificuldades da viagem de Grenoble até a Cartuxa, costumava ir lá de tempos em tempos para conversar com São Bruno e progredir na vida espiritual com seus conselhos e exemplos. Mas a fama do fundador se estendeu para além de Grenoble e chegou aos ouvidos de seu antigo discípulo, Eudes de Châtillon, que, ao ceifar a tiara pontifícia, havia tomado o nome de Urbano II. Quando ouviu falar da santa vida que levava seu mestre e, convencido de que era um homem de ciência e prudência excepcionais, o Pontífice mandou chamá-lo a Roma para que o auxiliasse com seus conselhos no governo da Igreja. Dificilmente poderia ter-se apresentado ao santo uma ocasião mais amarga de demonstrar sua obediência e fazer um sacrifício tão custoso. Apesar disso, partiu da Cartuxa no início do ano 1090, depois de nomear Landuino prior do mosteiro. A partida de Bruno causou enorme dor a seus discípulos, e vários deles abandonaram o mosteiro. Os demais o seguiram até Roma; mas Bruno os convenceu a regressar à Cartuxa, da qual se haviam encarregado, durante sua ausência, os monges de Chaise-Dieu.


“São Bruno rejeita o arcebispado de Régio da Calábria”, por Vincenzo Carducci.
“São Bruno rejeita o arcebispado de Régio da Calábria”, por Vincenzo Carducci.

São Bruno obteve permissão para estabelecer-se nas ruínas das termas de Diocleciano, de onde o Papa podia chamá-lo facilmente quando necessitasse. É impossível determinar com certeza a importância do papel de São Bruno no governo da Igreja. Algumas das disposições que antigamente lhe eram atribuídas foram, na realidade, obra de seu homônimo, São Bruno de Segni; mas não há dúvida de que nosso santo colaborou na preparação de vários Sínodos organizados por Urbano II para reformar o clero. Por outro lado, o espírito contemplativo do fundador da Cartuxa levava-o naturalmente a trabalhar sem alarde. O Papa tentou nomeá-lo arcebispo de Régio, mas o santo soube defender-se com tanta habilidade e apresentou ao Pontífice tais argumentos para que o deixasse retornar à solidão, que Urbano II acabou concedendo-lhe permissão para retirar-se à Calábria; contudo, não lhe permitiu voltar à Cartuxa, a fim de tê-lo sempre por perto. O conde Rogério, irmão de Roberto Guiscardo, ofereceu ao santo o belo e fértil vale de La Torre, na diocese de Squillace. Ali se estabeleceu São Bruno com alguns discípulos que havia conquistado em Roma. É impossível descrever o fervor e a alegria que o fundador da Cartuxa experimentou ao regressar à vida solitária. Escreveu então uma carta muito afetuosa a seu amigo Raúl de Reims, convidando-o a juntar-se a ele, lembrando-lhe com bondade a promessa que lhe havia feito e descrevendo com entusiasmo as alegrias e delícias que ele e seus companheiros encontravam naquele gênero de vida. A carta demonstra amplamente que São Bruno não era um homem melancólico e severo.


A alegria, que sempre acompanha a verdadeira virtude, é particularmente necessária às almas que vivem na solidão, pois nada lhes é tão prejudicial quanto a tristeza e a tendência exagerada à introspecção.

Em 1099, Landuino, o prior da Cartuxa, foi à Calábria consultar São Bruno sobre certos pontos do instituto que havia fundado, pois os monges não queriam afastar-se um só ápice do espírito do fundador. Bruno escreveu-lhes então uma carta cheia de ternura e espiritualidade, na qual lhes dava instruções acerca da vida eremítica, resolvia suas dificuldades, consolava-os dos sofrimentos e os animava à perseverança. Em suas duas ermidas da Calábria, chamadas Santa Maria e Santo Estêvão, Bruno soube inspirar o verdadeiro espírito da Cartuxa. No aspecto material, recebeu generosa ajuda do conde Rogério, com quem chegou a estreitar uma grande amizade. O santo costumava visitar o conde e sua família em Mileto por ocasião de algum batismo ou celebração familiar; por sua vez, Rogério costumava passar algumas temporadas em La Torre. Bruno e o conde morreram com três meses de diferença. Certa vez, quando Rogério sitiava Cápua, salvou-se de uma traição de um de seus oficiais graças a um aviso de São Bruno em sonho. Quando o conde comprovou a traição, condenou o oficial à morte, mas São Bruno obteve o perdão para ele.


“A morte de São Bruno”, por Vincenzo Carducci.
“A morte de São Bruno”, por Vincenzo Carducci.

No fim de setembro de 1101, São Bruno contraiu sua última enfermidade. Sentindo aproximar-se a morte, mandou chamar todos os monges e fez uma confissão pública e uma profissão de fé. Seus discípulos encarregaram-se de transmitir à posteridade essa profissão. O santo expirou no domingo, 6 de outubro de 1101. Os monges de La Torre enviaram um relato de sua morte às principais igrejas e mosteiros da Itália, França, Alemanha, Inglaterra e Irlanda, pois era então costume pedir orações pelas almas dos falecidos. Esse documento, juntamente com os “elogia” escritos pelos cento e setenta e oito que receberam o relato de sua morte, é um dos mais completos e valiosos que existem. São Bruno nunca foi formalmente canonizado, pois os cartuxos evitam toda manifestação pública. No entanto, em 1514, obtiveram do Papa Leão X a permissão de celebrar a Festa de seu fundador, e Clemente X a estendeu a toda a Igreja do Ocidente em 1674. O santo é particularmente venerado na Calábria, e o culto que lhe é prestado reflete, de certo modo, o duplo aspecto — ativo e contemplativo — de sua vida.


Embora não exista uma biografia propriamente dita de São Bruno escrita por um contemporâneo, há muitos dados sobre ele em diversas fontes. A Vita antiquior (Acta Sanctorum, out., vol. III) certamente não foi escrita antes do século XII. Mas basta ler a autobiografia de Guiberto de Nogent, a vida de São Hugo de Grenoble escrita por Guigues e as crônicas e cartas da época (entre as quais se contam duas do próprio São Bruno) para obter um retrato vívido do fundador da Cartuxa. Esses materiais foram utilizados no artigo do Acta Sanctorum e no que lhe dedica Dom Le Couteulx em suas Annales Ordinis Cartusiensis, vol. I. Entre as biografias modernas que aproveitam as mesmas fontes, destacam-se a de H. Lübbel, Der Stifter des Karthäuserordens (1899), e a Vie de S. Bruno, escrita por um monge cartuxo; esta última é algo menos crítica. Veja-se também os estudos mais leves de Boyer d’Argen e M. Gorse, ambos publicados em 1902. Os cartuxos de Montreuil-sur-Mer reimprimiram, em 1891–1892, os escritos de São Bruno, que são em sua maioria comentários à Sagrada Escritura. Sobre as relações do santo com o arcebispo Manassés, cf. Wiedermann, Gregor VII und Erzbischof Manasses I von Reims (1885), Héfélé-Leclercq, Conciles, vol. V, pp. 220–226. Há uma bibliografia relativamente completa no artigo Chartreux do DTC, vol. II, cols. 2279–2282. Veja-se também Dictionnaire de Spiritualité, vol. II, cols. 705–776. [2]



Considerações práticas


Detalhe de “São Francisco de Borja assistindo um moribundo impenitente”, por Francisco de Goya.
Detalhe de “São Francisco de Borja assistindo um moribundo impenitente”, por Francisco de Goya.

I. Um grande e célebre doutor, que na aparência vivera piedosamente, que morrera depois de receber os santos sacramentos… condenado! Fato verdadeiramente terrível! Ou ele tinha recebido de forma indigna os santos sacramentos ou, após recebê-los, cometera um pecado mortal e nele morrera. 


Nem sempre morrem felizes os que receberam os sacramentos. Nem todos que se confessam e participam da Santa Eucaristia antes do fim salvam suas almas. Muitos se confessam e recebem a Sagrada Comunhão no leito de morte e, ainda assim, são condenados.


Entre eles estão, em primeiro lugar, aqueles que, quando saudáveis, muitas vezes recebem indignamente os santos sacramentos — seja ocultando um pecado mortal de propósito na confissão; seja não se arrependendo das próprias faltas; seja não manifestando o firme propósito de evitar não só todo pecado, mas também toda ocasião de pecado — e neste estado ousam receber a Sagrada Comunhão. A vergonha, que impede muitos de confessar corretamente os seus pecados na saúde, é ainda maior na hora da morte. O Maligno os faz acreditar que sua doença não é perigosa e que eles serão mais capazes de confessar-se quando estiverem bem novamente; ou, ainda, que é impossível repetir todas as suas confissões inválidas anteriores. Acontece então que, assim como na saúde se confessavam mal e comungavam indignamente, na doença fazem o mesmo. 


Em segundo lugar, há aqueles que viveram com grande ódio por longo tempo, não perdoando aos seus inimigos.


Em terceiro lugar, há os adictos ao vício da impureza, que não se esforçaram por emendar-se quanto tinham saúde. Estes têm todos os motivos do mundo para temer que, mesmo recebendo dignamente os santos sacramentos no leito de morte, virão a cair novamente no velho pecado, morrer nele e ir assim para a perdição eterna. Isso porque o Maligno volta ao ataque depois que as pessoas recebem os sacramentos, representando-lhes mais intensamente o mal que fizeram, de modo a renovar neles o ódio ou prazer sensual a que anteriormente se entregavam e fazê-los pecar por complacência e desejo. Como se acostumaram a ceder às tentações do demônio, eles serão facilmente vencidos pelo pecado de novo; e, caso morram sem outra confissão, ou se esta lhes for impossível, sem contrição perfeita, certamente eles serão condenados.


Oh! Que as três classes de homens acima mencionadas considerem devidamente o terrível perigo de sua situação. Para evitá-la, confesse-se e comungue com retidão. Não alimente nenhum ódio em seu coração, e não seja escravo do pecado de impureza, ou, se infelizmente ele se apoderou de você, aparte-se dele. Acostume-se a lutar sempre com coragem contra as tentações de Satanás.


A queda dos anjos rebeldes por Luca Giordano.
A queda dos anjos rebeldes por Luca Giordano.

II. Com o fim miserável do célebre doutor, São Bruno encheu-se de um temor salutar e resolveu viver em grande austeridade, de modo a justificar-se perante o tribunal do Altíssimo e escapar do Inferno. Lemos e ouvimos tantos exemplos terríveis de pessoas que morrem sem tempo para arrepender-se. Por que, então, você não se decide a fazer penitência e reformar-se a si mesmo? Receio que não considere tão seriamente, como fez São Bruno, o que seja comparecer ao tribunal de um Juiz justíssimo e onisciente, e perder-se por toda a eternidade. Para a sua própria salvação, exorto e suplico a você que, de agora em diante, reflita constantemente acerca do julgamento de Deus. Medite com frequência sobre o Inferno. [3]


Pensa no juízo divino”, diz São Cirilo de Jerusalém, “e nem a impureza nem qualquer outro vício terá poder sobre ti. Assim que te esqueceres de Deus e de seu juízo, hás de cogitar o pecado e cometê-lo.”

Imploro-vos”, diz São João Crisóstomo, “pensai no Inferno. O Maligno faz de tudo para que vos esqueçais da danação eterna. É pensando seriamente a respeito do Inferno que havemos de evitá-lo.



Santa Maria Francisca de Nápoles
Santa Maria Francisca de Nápoles.

Bárbara Basinsin, mãe de nossa santa, sofreu muito antes de dá-la à luz, devido aos maus-tratos de seu iracundo marido e a uma série de sonhos espantosos que teve. Para se consolar, abriu seu coração ao franciscano São João José da Cruz e ao jesuíta São Francisco de Jerônimo. Ambos a confortaram e profetizaram a santidade da menina que estava por nascer. Ela veio ao mundo em Nápoles, em 1715, e foi batizada com os nomes de Ana Maria Rosa Nicolasa. Quando tinha dezesseis anos, seu pai, Francisco Gallo, tentou casá-la com um pretendente de boa família, encantado por sua beleza e virtude. Mas Ana, que já havia decidido consagrar-se a Cristo, enfrentou a cólera paterna e recusou o casamento. Levado por seu caráter brutal, Francisco Gallo espancou a filha e trancou-a em um quarto a pão e água. A jovem aproveitou com alegria essa ocasião para sofrer por Deus. Enquanto isso, sua mãe fazia o possível para convencer o marido a permitir que a filha seguisse sua vocação e ingressasse na Terceira Ordem de São Francisco. Para isso, chamou um frade observante, chamado Teófilo, que conseguiu mostrar a Francisco a injustiça de sua atitude, fazendo-o desistir de obrigar a filha a casar-se.


Em 8 de setembro de 1731, Ana tomou o hábito da Terceira Ordem na igreja dos franciscanos reformados alcantarinos, em Nápoles. Em prova de sua devoção à Paixão de Cristo, tomou o nome de Maria Francisca das Cinco Chagas. Conforme o costume da época, viveu em casa, dedicada à piedade e ao trabalho. Durante os últimos trinta e oito anos de sua vida, foi governanta de um sacerdote secular chamado João Pessiri. Irmã Maria Francisca experimentou fenômenos místicos extraordinários. Ao rezar a Via-Sacra, especialmente nas sextas-feiras da Quaresma, sofria os diferentes tormentos da Paixão o Senhor: a agonia no Horto, a flagelação, a coroação de espinhos etc. A cada semana padecia uma tortura diferente, na mesma ordem vivida por Cristo, e na última sexta-feira da Quaresma entrava em transe semelhante à morte. Também se dizia que tinha gravadas em sua carne as chagas da Paixão.


Santa Maria Francisca de Nápoles, Virgem
Santa Maria Francisca de Nápoles, Virgem.

Os fenômenos mais extraordinários, porém, estavam ligados à comunhão, que recebia diariamente com permissão do confessor. Conta-se que, em três ocasiões, a hóstia voou até seus lábios: uma vez escapando das mãos do sacerdote durante o “Agnus Dei”; outra, voando do cálice; e, na terceira, elevando-se do cibório. O barnabita São Francisco Xavier Bianchi testemunhou ainda outros milagres ligados ao Sangue Precioso.


No Natal de 1741, Maria Francisca chegou às alturas do matrimônio místico: rezava diante do presépio e pareceu-lhe que o Menino Jesus estendia a mão e lhe dizia: “Esta noite serás minha esposa.” Tal experiência causou-lhe cegueira até o dia seguinte. Suas visões e êxtases eram tão frequentes que seria impossível enumerá-los.


A esses sofrimentos somavam-se sua frágil saúde e as dores causadas por seu pai e parentes com sua atitude agressiva. Além disso, impunha a si mesma severas penitências e pedia a Deus para compartilhar as penas das almas do purgatório (inclusive as de seu pai, após sua morte) e dos enfermos. Disse certa vez ao confessor: “Sofri em minha vida tudo o que é possível sofrer.” Sacerdotes, religiosos e leigos buscavam nela conselho e ajuda. A um frade franciscano, disse: “Cuidado para não fomentar ciúmes entre as penitentes. Nós, mulheres, somos muito inclinadas a isso; falo por experiência.”


Santa Maria Francisca viveu até o início da Revolução Francesa e predisse claramente seus desdobramentos: “Vejo desastres no presente e ainda maiores no futuro. Peço a Deus que não permita que eu os presencie.” Deus a chamou a Si em 6 de outubro de 1791. Foi sepultada na igreja de Santa Lúcia do Monte, em Nápoles. Prometera a São Francisco Xavier Bianchi aparecer-lhe três dias antes de sua morte, e assim o fez, em 28 de janeiro de 1815. Foi canonizada em 1867.


Pouco depois de sua morte, o Pe. Laviosa, que a conheceu pessoalmente, publicou uma breve biografia, reeditada e ampliada em 1866, intitulada Vita di Santa Maria Francesca delle Cinque Piaghe di Gesù Cristo. O artigo de Léon em Auréole Séraphique, vol. I, pp. 278-286, baseia-se na tradução francesa dessa obra. L. Montella publicou outra biografia em 1866. Sobre seus fenômenos místicos, cf. H. Thurston, The Physical Phenomena of Mysticism (1952). [4]



Referência:


  1. Lives of the saints: compiled from authentic sources with a practical instruction on the life of each saint, for every day in the year, v. 2. New York: P. O’Shea, 1876, p. 432.

  2. Butler, Alban. Vida dos Santos, vol. 4, pp. 45-49.

  3. Artigo São Bruno, convertido por um cadáver do livro Lives of the saints: compiled from authentic sources with a practical instruction on the life of each saint, for every day in the year, v. 2. New York: P. O’Shea, 1876, p. 432.

  4. Butler, Alban. Vida dos Santos, vol. 4, pp. 50-52.



REZE O ROSÁRIO DIARIAMENTE!

Comentários


  • Instagram
  • Facebook
  • X
  • YouTube
linea-decorativa

“O ROSÁRIO
é a ARMA
para esses tempos.”

- Padre Pio

 

santa teresinha com rosas

“Enquanto a modéstia não
for colocada
em prática a sociedade vai continuar
a degradar,

a sociedade

fala o que é

pelasroupas

que veste.

- Papa Pio XII

linea-decorativa
jose-de-paez-sao-luis-gonzaga-d_edited.j

A castidade
faz o homem semelhante
aos anjos.

- São Gregório de Nissa

 

linea-decorativa
linea-decorativa
São Domingos

O sofrimento de Jesus na Cruz nos ensina a suportar com paciência
nossas cruzes,

e a meditação sobre Ele é o alimento da alma.

- Santo Afonso MARIA
de Ligório

bottom of page