Festa de São Rafael Arcanjo e a Vida de São Felix de Tibiuca (24 de outubro)
- Sacra Traditio

- 24 de out.
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A Bíblia menciona pelo nome apenas três dos sete arcanjos que, segundo a tradição judaica e cristã, se encontram mais próximos do trono de Deus: Miguel, Gabriel e Rafael. A Igreja, especialmente a do Oriente, venerava esses três arcanjos desde tempos muito antigos. Bento XV estendeu a toda a Igreja do Ocidente as Festas de São Gabriel e São Rafael.
No Livro de Tobias, lê-se que Deus enviou São Rafael para ajudar o ancião Tobit, que estava cego e em grande aflição, e Sara, filha de Raquel, cujos sete maridos haviam morrido na noite de núpcias. Quando Tobias, o jovem, foi à Média para cobrar um dinheiro devido a seu pai, São Rafael tomou forma humana e o nome de Azarias, acompanhando-o na viagem, auxiliando-o em suas dificuldades e explicando-lhe como poderia casar-se com Sara sem perigo algum. O próprio Tobias declara: “Ele me conduziu na viagem e fez-me voltar são e salvo. Recebi de Gabelo o dinheiro. Ajudou-me a casar e expulsou de minha esposa o espírito maligno, consolando seus pais. Salvou-me das fauces do peixe e fez-te ver a luz do céu. Por meio dele fomos cumulados de bens”.
Essas curas, e o nome Rafael, que significa “Deus operou a cura”, levaram alguns comentaristas a identificá-lo com o anjo que movia as águas na piscina milagrosa mencionada por São João (5, 1-4). A liturgia confirma essa identificação, pois o Evangelho da Missa de São Rafael é precisamente esse trecho do Evangelho de São João. No Livro de Tobias (12, 12 e 15), o próprio arcanjo se descreve como “um dos sete que estão na presença do Senhor” e conta que apresentava continuamente a Deus as orações do jovem Tobias.
Veja-se Acta Apostolicae Sedis, vol. XII (1922); cf. nosso artigo sobre São Miguel Arcanjo (29 de setembro). Sobre as menções a São Rafael nos documentos cristãos e a atual festa, veja-se Schuster, The Sacramentary, vol. V, pp. 189-191. No Ethiopic Synaxarium (1928), vol. IV, pp. 1274-1278, há um curioso relato sobre a dedicação de uma igreja a São Rafael em uma ilha da costa de Alexandria, no início do século V. 1

No início da perseguição de Diocleciano, muitos cristãos entregaram aos perseguidores os livros sagrados para que fossem queimados. Alguns tentaram justificar seu proceder ou minimizar sua culpa, como se as circunstâncias pudessem desculpar a cooperação em um ato ímpio ou sacrílego. Félix, bispo da África Proconsular, longe de seguir o mau exemplo de tantos outros cristãos, sentiu-se antes estimulado a adotar uma conduta vigorosa e vigilante. O magistrado de Tibiuca, Magniliano, ordenou-lhe que entregasse todos os livros e escritos sagrados para que fossem queimados. O mártir respondeu que devia obedecer a Deus antes que aos homens, e então Magniliano o enviou ao procônsul de Cartago.
Segundo o relato do martírio, o procônsul, enfurecido pela valente confissão do santo, mandou acorrentá-lo e encerrá-lo em uma terrível masmorra. Nove dias depois, enviou-o em um navio à Itália para que fosse julgado por Maximino. A travessia durou quatro dias; o bispo foi encerrado no porão do navio com os cavalos e não provou alimento nem bebida. Os cristãos de Agrigento, da Sicília e de todas as cidades por onde o santo passou o acolheram jubilosamente. Em Venosa da Apúlia, o prefeito mandou tirar-lhe as correntes e perguntou se realmente possuía livros sagrados e por que razão se recusava a entregá-los. Félix respondeu que não podia negar que possuía livros sagrados, mas que jamais os entregaria. Sem mais investigações, o prefeito mandou decapitá-lo. No local da execução, São Félix deu graças a Deus por sua bondade e logo inclinou a cabeça diante do carrasco, oferecendo-se em sacrifício Àquele que vive pelos séculos dos séculos. Tinha então cinquenta e seis anos. Foi uma das primeiras vítimas da perseguição de Diocleciano.
A lenda da deportação de São Félix à Itália e de seu martírio naquele país é uma invenção do hagiógrafo, que quis transformá-lo em um santo italiano. Está fora de dúvida que São Félix foi martirizado pelo procônsul de Cartago. Suas relíquias foram mais tarde trasladadas para a famosa “Basílica Faustina” daquela cidade.
O Pe. Delehaye publicou um notável estudo sobre o relato do martírio de São Félix em Analecta Bollandiana, vol. XXXIX (1921), pp. 241–276. Os materiais reunidos em Acta Sanctorum, outubro, vol. X, eram insuficientes. O Pe. Delehaye publicou os textos mais representativos dos dois principais grupos e fez uma reconstrução admirável do documento primitivo no qual se baseiam fundamentalmente as duas famílias de textos. Como dissemos acima, a deportação do mártir à Itália é uma invenção dos hagiógrafos posteriores, que adornaram livremente o texto original. Segundo afirma o Pe. Delehaye (cuja opinião coincide com a expressa por M. Monceaux em Revue Archéologique, 1905, vol. I, pp. 335–340), Félix foi condenado à morte pelo procônsul de Cartago. Ao que parece, o martírio teve lugar em 15 de julho, ou talvez em 16. A Festa foi transferida primeiro para 30 de julho e, mais tarde, para 24 de outubro, devido a certas confusões; sobre este ponto, cf. Delehaye e, sobretudo, Dom Quentin, Les Martyrologes Historiques, pp. 522–532 e 697–698. 2
Referência:
1. Butler, Alban. Vida dos Santos, vol. 4, pp. 190-191.
2. Ibid. pp. 191-192.


























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